Arte social – criação coletiva

COLETIVO DE ARTISTAS VISANDO PROMOVER NOVAS SENSAÇÕES E PROVOCAR ESTADOS MÚLTIPLOS DE LIBERDADE INTERIOR

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

NÃO AO NÃO

“Isto não é arte”
Pierre Bourdieu no livro “A economia das trocas simbólicas” ¹ disserta sobre o mercado de obras de arte analisando o sistema de arte, sua formação e evolução histórica concluindo, entre outros detalhes, sobre componentes deste sistema específico que tocou-nos diretamente ao lermos o que foi chamado de “Edital de Exposições 2010 do Grupo Livrarias Curitiba”.
O autor marca um período, o Sec. XIV, como início de um processo de “autonomização” do artista que teria produzido na desejada separação da tutela da Igreja e do Estado, um outro aparato de “validação” da obra de arte com determinados efeitos colaterais. Com o desenvolvimento cultural sob novos parâmetros que então passa a incluir uma burguesia que foi se afirmando, o sistema de arte, segundo afirma Bourdieu, assumiu características do pensamento e das práticas que se impunham no ocidente dados no formato em que se construía o processo civilizatório de que somos herdeiros.
Se antes a Igreja e o Estado davam conta de impor critérios de validação da arte, no novo modelo se acrescenta a burguesia e seus instrumentos ideológicos: o mercador, o crítico e a academia. P. Bourdieu afirma que, de forma descontínua esta fórmula é a base da “indústria cultural” apontada por Adorno e Horkheimer no século XX!
Foi baseado nesta ordem teórica e na prática de realizadores de arte que fizemos,
no Coletivo ARTIXX esta avaliação do “edital de Exposições 2010 do Grupo Livrarias Curitiba”.
O sistema social e econômico atualmente formatado coloca a arte e portanto, o trabalho e a vida do artista, num determinado nível que, por influências iluministas, determina para ela classificações no nível da infra-estrutura de uma lógica puramente economicista, ou seja, pragmaticamente excluindo o conteúdo subjetivo que representa a arte livre, colocada abaixo dos valores puramente pragmáticos da organização social dominante, destituída de transcendências e pobres, por isso mesmo.
É impossível convencer qualquer artista consciente de seu trabalho de uma coisa assim, oposta a historia da arte e, portanto, os artistas que são convencidos são os que não fazem a reflexão honesta de si mesmos e de seus trabalhos, o que determina o nível ético de uns e de outros.
O artista que hoje ainda aceita ver seu trabalho reduzido a uma mercadoria comum aceita limitar-se a ser acessório de negócios relacionados à acumulação de poder e de capital que são, sabemos, cada vez mais a mesma coisa.
Jürgem Habermas, em seu texto “Leituras em resistência cultural” acrescenta à nossa reflexão:
Embora o governo possa oferecer apoio subsidiado, a arte é, hoje em dia [...] o brinquedo de patrocinadores (de sociedades acionárias) cuja relação com a cultura é menos de uma nobre obrigação do que uma manipulação aberta como signo de poder, prestígio, publicidade. Aparentemente como Jean Baudrillard sugere, o controle da acumulação não é suficiente para essa classe, ela deve controlar a significação também” e conclui: “o capital penetrou inteiramente no signo”.
O Coletivo ARTIXX tem a dizer sobre o Edital do Grupo Livrarias Curitiba de 2010 que, ao nos questionarmos sobre este edital e o objetivo para que as Livrarias Curitiba se envolvessem neste tipo de empreendimento artístico cultural nos deparamos com algumas questões que aqui seguem.
Partimos do princípio do olhar das Livrarias Curitiba sobre a produção artística local, e questionamos se esta instituição comercial tem algum conhecimento sobre a logística necessária para promover uma exposição cultural como a que propõe. E perguntamos:

1. Qual é o objetivo maior das Livrarias Curitiba?
Ao não se responsabilizar por nada ao se promover às custas de alguns artistas sedentos por um espaço em que possam mostrar suas obras.

2. Qual é o incentivo a que se refere no edital?
A empresa não se responsabiliza pela integridade física das obras, o artista é responsável pela montagem e desmontagem e a empresa nem fornece materiais necessários para a montagem; Que tal fornecer pelo menos fita crepe, cola, tesouras que imaginamos ter de sobra?

3. O que a empresa pensa sobre o profissional das artes?
A visão que esta empresa tem sobre o artista plástico é anti-profissional e lega ao artista uma vida de trabalho sem honorários, coloca, assim, o artista como escravo, ampliando aquela visão de que arte é o supérfluo e a de que quem abre um espaço expositivo está fazendo um favor, como se estivesse dando esmolas. O artista não é tratado como um profissional sério.

4. O que a empresa oferece aos artistas?
Uma instituição que pretende abrir um espaço para artistas deveria antes se cercar de alto conhecimento técnico e principalmente de respeito aos profissionais envolvidos.

5. O que podemos concluir como artistas?
Quando levantamos estes questionamentos, nos referimos a este edital, sabendo que isto se adéqua à maioria dos editais e de outros instrumentos de incentivo à cultura que temos visto pelo país inteiro, ocupando o espaço vago das políticas culturais que o Estado não propicia por pura omissão e incompetência.

Podemos, baseados na nossa vivência de artistas e de cidadão e cidadãs consciente do trabalho que realizamos e do nosso envolvimento com a esperança no futuro, fazer da intenção deste instrumento de uso e abuso das nossas capacidades, por uma instituição que não nos compreende minimamente, redigir este protesto como a única ação possível diante de todos que não nos vêem com respeito ético.

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